sábado, 16 de maio de 2015

Uma familia PHDA




Sermos pais de seres humanos especiais é uma prenda… e um desafio.
Nós pais, há muito que aceitamos os nossos filhos com todas as suas características e a sua maneira de ser. Mas a sensação de incompreensão, de solidão que nos acompanha no dia-a-dia é brutal. Magoa profundamente e deixa cicatrizes permanentes.
Nós convivemos diariamente com várias destas crianças e o que conseguimos ver são crianças amorosas, meigas, mexidas, que nos dão um prazer enorme com as suas expressões, as suas saídas impulsivas, mas maioritariamente engraçadas, nas respostas. Mas é também comovente sentir as suas mágoas, sentir como estão magoadas por não serem sempre aceites ou compreendidas. Elas apercebem-se dos olhares reprovadores, da voz sem paciência.
Sim, acredito que será realmente aborrecido para algumas pessoas estarem num café e terem uma criança aos berros, a pular nas cadeiras, sempre a mexer e a correr. Mas será que essas mesmas pessoas não serão capazes de ver a alegria e a felicidade que emana dessa mesma criança? Tenho que fazer uma ressalva, nem toda a criança mexida, irrequieta é uma criança com PHDA, muitas vezes são simplesmente crianças. Algumas ultrapassam os limites. Não quer dizer que sejam ou venham a ser PHDA.
Muitas crianças fazem birras e choram e exigem.... mas aí o problema é educacional, pois as crianças sem limites ou sem regras podem por vezes comportar-se muito pior que um PHDA. Existindo ou não um diagnóstico a educação é fundamental a todas as crianças.
Pensem também o quanto é aborrecido para os PHDA serem rotulados de mal-educados por comportamentos impulsivos, que não conseguem controlar, antes de criticarem vejam se realmente aquela criança tem falta de educação, se tem falta de regras. Se todos os pais de crianças sem PHDA se empenhassem da mesma maneira que os pais de crianças com PHDA na educação dos seus filhos, todos eles seriam génios, muito bem-educados, comportados e organizados.
Os meus três filhos, devido ao peso da genética, herdaram a PHDA, já que ambos os pais são portadores (que chance tinham?). São jovens com alterações de comportamento, com impulsividade, com carência de aptidões sociais, distraídos, mas extremamente sensíveis, amorosos, honestos, de sorriso fácil. Como todos os pais, achamos que eles são especiais e tentamos fazê-los perceber o seu valor, como os seres humanos maravilhosos que são.
A nossa relação com eles é uma relação aberta e verdadeira, nós não lhes mentimos, eles não nos mentem, só assim conseguimos que eles confiem em nós.
Sempre lhes dissemos qual era o seu diagnóstico e o que era ser PHDA. Mas nunca lhes pintamos um quadro negro de uma deficiência. Parte desse quadro já eles o tinham no seu dia-a-dia, no relacionamento com os colegas, no trato por parte dos professores e da escola. Nós tínhamos que lhes mostrar que eles são capazes de muito mais e que são muito mais do que apenas um diagnóstico, eles portadores de PHDA, mas não são PHDA. Eles são capazes de tudo, basta que queiram e que façam o que gostam, com esforço e com apoio.
Quero que eles percebam, algo que demorei imenso a perceber, que o respeito por nós próprios e pelas nossas características é fundamental para a nossa saúde mental, para o nosso bem-estar. Que não podemos e não devemos passar a vida a tentar agradar o próximo, antes de nós mesmos, não nos podemos apagar. Sim!...  Temos que viver em sociedade, temos que respeitar o próximo e nos tentar adaptar, sem jamais nos anular.
Os portadores de PHDA têm muitas características diferentes, mas nem todas elas são más. A nossa ingenuidade, a nossa sinceridade, a nossa falta de habilidade para fingirmos (sim, podemos fingir, mas não por muito tempo, pois isso custa-nos imenso), a nossa alegria, a nossa efusividade, o nosso pensamento a mil à hora, a nossa mente sempre com ideias novas (nem todas aproveitáveis, claro) e a nossa criatividade são alguns dos nossos pontos positivos.
Não precisamos medicar os nossos filhos para que nos obedeçam, eles fazem isso sempre que se lembram, medicamo-los para se adaptarem melhor à vida em sociedade, à vida escolar. Para serem melhor aceites pelos seus pares. Os meus filhos por vezes dizem-nos ”é melhor hoje eu tomar o comprimido, quero causar uma boa impressão” quando vamos conhecer alguém novo. Eles notam a diferença do seu comportamento e que são melhores aceites assim.
 Porém, termos um filho adolescente que nos diz, mãe eu não tenho amigos, eu sou um "forever alone", dói. São jovens que se refugiam na família, no seu porto seguro, pois lá fora é mau, lá fora estão sozinhos ou são ignorados ou gozados e humilhados. Jovens carinhosos, meigos, doces, sensíveis, alegres, mas que não se conseguem controlar e fingir serem "normais" e mesmo que conseguissem, para estarem bem com os outros não o estariam com eles próprios!
Mas para alguns profissionais da área da saúde esta perturbação não existe, e que são contra a medicação. Afirmam que se houver um maior suporte familiar e mais regras a coisa resolve-se. Na minha opinião deviam deixar de pintar um mundo que não existe. São os pais o mundo destas crianças, é a família o seu porto seguro, e sua fonte de alegria e felicidade. Se estas crianças não tiverem um suporte familiar firme e um amor incondicional, se não forem os pais, em casa a afirmar o seu valor, e tentar elevar a sua auto-estima e tratá-los como eles merecem, a cuidar das suas feridas, o que lhes acontecerá? Depressões, tentativas de desaparecer. Depois será a sociedade e a comunidade a trabalhar com eles?
Ainda temos uma grande luta pela frente, sei que vamos ter que secar muitas lágrimas, nossas e deles. É uma luta pelo respeito, pela compreensão da PHDA, de tentar fazer com que a sociedade se aperceba que nem tudo o que fazemos é por mal, em geral foi mesmo sem querer, por impulso, por distracção. Não foi por maldade, não foi por descaso ou por não nos preocuparmos.
Mas como pais sinto que cumprimos a nossa missão, estamos a formar bons seres humanos, seres humanos que se aceitam como são, que aceitam as suas diferenças, que conseguem brincar com isso. Mas que têm respeito pelo próximo, que são honestos, sinceros e verdadeiros.
Por vezes sinto que falhamos, sei que não somos perfeitos, que temos falhas, mas dentro das nossas capacidades fizemos o melhor que podíamos e conseguimos o nosso objectivo:
Sermos felizes enquanto indivíduos e família.

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