domingo, 24 de novembro de 2019

Autistas são bons em seguir regras?



Hoje descobri este canal que fala sobre TEA (Transtorno do Espectro do Autismo) e ao assistir este video pus-me a pensar em mim e na minha infância. Todos os meus comportamentos atípicos ao longo da minha vida, desde a primeira infância. Ou seja além de PHDA tenho características de TEA, eu já sabia, só que hoje foi me lembrando de factos específicos.

Ainda hoje é uma história engraçada na família contar sobre o facto de um bater nas orelhas quando estava frustrada ou enervada. O fato que eu detestava beijos e a minha mãe me obrigava a aceitar os beijos das suas amigas (pessoas que não faziam parte da minha família), e eu a seguir e sem disfarçar limpava o local aonde me tinham beijado.

Então seguir as regras... Eu seguias à letra. Lembro-me que ia sempre para a escola e da escola para casa de boleia com a professora, que me levava até à porta de casa; um dia a minha mãe disse-me de manhã para avisar a professora que não precisava me levar até a casa. Eu literalmente disse a professora que não era para me levar a casa. O que resultou em eu ficar na escola até ao fim da tarde. Por sorte a minha escola era em frente à casa da minha madrinha e quando me viram no portão aquela hora ficaram assustados e levaram-me a casa. Minha mãe estava furiosa, meu pai estava na fazenda, nesse dia levei uma das maiores surras da minha vida, ao ponto de fazer xixi pernas a baixo.

Tive durante a vida vários episódios assim, aonde me davam uma ordem e não me explicavam o que queriam exactamente o que queriam de mim e eu seguia literalmente a ordem, o que levava a vários castigos e surras. 

Eu era considerada a distraída, que estava sempre no mundo da lua, lenta... E que não fazia o que me mandavam. E é claro sofria de bullying na escola primária.

Eu tinha uma paixão inabalável pelo meu irmão e o meu hiperfoco era ele. Era pedir aos meus pais que lhe comprassem coisas, eu nunca pedia nada para mim. Outro hiperfoco era fazer o máximo para tentar agradar e nunca conseguir, daí me sentir frustrada e bater nas orelhas. 

Adorava ficar sozinha, na fazenda eu ia sentar-me em cima de uma pilha de sacos de café e passar lá a tarde toda. Ou ficar dentro de um armário para ficar só, sem barulhos e sem ver ninguém. também tinha fobia à comida, eu odiava comer, ter que mastigar e recusava-me a experimentar novos sabores.

Eu seguia as regras, mas as regras que percebia, como as entendia e não o que realmente era-me pedido. 

Ainda hoje tenho problemas de relacionamento, pois sou diferente, faço tudo de maneira diferente, penso de maneira diferente, tenho vivências e experiências diferentes. Tirando o meu marido, os meus filhos, ninguém mais pode invadir o meu espaço pessoal. Sou hiper mega meiga mas so com eles evitando o contacto directo com outras pessoas. Não tenho raízes, não me apego a lugares, se precisar mudar, mudo e pronto. Seja de emprego, de local, de casa. Mas tenho uma noção muito própria do que é meu, não me importo de emprestar, mas tem que cuidar daquilo como eu ou fico furiosa. 

Sou directa e cada dia mais, pois com ajuda do meu psiquiatra consegui desformatar a "simulação social" e fazer o que era esperado, para começar a fazer o que eu quero, como eu quero, da maneira que eu gosto.

E sim, fui aprendendo a desmontar algumas ordens e a realizá-las.

Mas tens razão willian, bater não educa, apenas nos ensina a ter medo.

Sensação de impotência



Aos fim de alguns anos de calmaria, o fim de semana anterior foi passado com a sensação de surpresa e impotência.

Meu doce filho que é portador de autismo leve (ex asperger), altamente funcional e com maior idade, teve uma terrível dor de dentes, E com ela reapareceram comportamentos que há muito e alguns mesmo nunca tínhamos assistido.

É assustador vermos uma "criança" com quase 1.90 mts aos berros (não sei como os vizinhos não chamaram a policia), em pura frustração e agonia, sentado no chão e a balançar-se para a frente e para trás ( o que tínhamos visto fazer apenas uma vez), tentar se auto agredir (tentando morder o próprio braço) e a nos perguntar o que ele tinha feito para merecer aquilo.

Nós tentamos ajudá-lo de todas as formas, mas os dentistas estavam todos fechados, acabamos por ir ao SUB para ao menos lhe aliviarem as dores. Ele foi medicado lá, por uma enfermeira excepcional que teve imensa paciência com ele, pois ele tem medo de agulhas e viemos com uma receita na mão.

Ao fim de 1 hora, sem nenhum alívio, dei-lhe mais uma injecção para as dores.  Passodo três horas voltamos às urgências, sem ele ter alivio na dor.

Ele gritou, ele se mordeu, ele ficou frustrado, furioso, mas a cada pouco nos pedia desculpas, pedia "colo", outras sentia-se preso e andava pela casa a dar pancadas no local da dor, por fim acabou por adormecer de cansaço.

Não consegui ajudá-lo como queria, chorei de raiva, de frustração, rezando para que aquela dor passa-se para mim. Foi o pior que já passei com ele, foi incapacitante.

O que é que nós poderíamos ou devíamos ter feito? Alguém tem alguma ideia?